Instituto Futebol de Rua: um drible nas dificuldades e um golaço pela transformação social

Transformação social: fundador do Instituto Futebol de Rua (FdR) conta como o esporte tem auxiliado no desenvolvimento humano de crianças e ad...

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Instituto Futebol de Rua: um drible nas dificuldades e um golaço pela transformação social

Transformação social: fundador do Instituto Futebol de Rua (FdR) conta como o esporte tem auxiliado no desenvolvimento humano de crianças e adolescentes pelo país

Desde 2006, o advogado Alceu Natal Neto usa sua paixão pelo futebol como uma ferramenta de transformação social para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Aliando esporte, educação e cultura, o fundador do Instituto Futebol de Rua (FdR) já impactou, com o projeto, a vida de mais de 18 mil meninas e meninos de todo o Brasil.

Com sede em Curitiba, a organização sem fins lucrativos realiza atividades em 22 municípios e conta com uma rede de voluntários que congrega mais de 500 pessoas.

Em 2020, com a pandemia de Covid-19, o Instituto Futebol de Rua (FdR) precisou se reinventar: com a impossibilidade de reunir as crianças e realizar as aulas em ginásios e quadras, preparou uma cartilha com diversas atividades para serem realizadas em casa durante o isolamento social e promoveu lives com educadores, artistas e outros profissionais ligados ao FdR.

Durante a pandemia, o Instituto ainda tem se destacado por uma campanha que reuniu grandes nomes do futebol como Kaká, Alex, Alexandre Pato, Jô, Raí, além do embaixador do FdR, Carlinhos Neves, e o cantor Nando Reis.

A corrente solidária nas redes sociais começou em 2020 e segue com arrecadações de alimentos, itens de higiene e produtos de limpeza para ajudar as famílias atendidas pelo Instituto e que estão passando por dificuldades.

O fundador do Instituto Futebol de Rua conversou com o portal ColaboreSe sobre as ações de impacto positivo, a importância do esporte para a inclusão e transformação social, o papel da sociedade civil em projetos como esse e como o esporte tem virado o jogo em tantas comunidades brasileiras.

Confira a entrevista na íntegra:

Qual o papel do esporte na inclusão e transformação social?

Alceu Natal Neto: O esporte é muito mais do que lazer ou qualidade de vida. É a oportunidade de muitas crianças e jovens vislumbrarem um futuro melhor, aliado também a uma educação melhor. O esporte educa, cria vínculos e ensina valores que nenhum outro espaço hoje seria capaz de proporcionar.

Considero o esporte como um dos ambientes mais democráticos da sociedade, no qual as diferenças sociais não importam, mas sim a técnica, a habilidade e a dedicação. Mas para realmente termos no esporte uma vazão transformadora e de mudança social, carecemos de políticas públicas eficientes e justas. Hoje, o Terceiro Setor vem fazendo isso muito bem, mas precisamos de muito mais.

A corrente solidária nas redes sociais começou em 2020

O Instituto desenvolveu uma metodologia própria para atuar com as crianças e os adolescentes do projeto. Como as regras do futebol têm ajudado na formação de cidadãos?

Alceu Natal Neto: Dentro da Metodologia Futebol de Rua temos dois momentos que se completam: o esportivo e o da formação humana. O momento da formação humana é conduzido por profissionais da área de pedagogia, no qual trabalhamos eixos transversais da educação que acreditamos ser importantes na vida futura das crianças, tais como meio ambiente, saúde, cultura, combate ao racismo, gênero, cultura de paz, educação financeira e comunicação.

Também temos um espaço ao patrocinador do projeto, que pode escolher mais um tema a ser trabalhado pelo Instituto. Nesse caso, fazemos em conjunto, desde o desenvolvimento do material até o conteúdo das aulas.

Já na parte esportiva, a ideia foi simplificar o jogo e deixar ele o mais bonito possível para quem joga e para quem assiste. Dessa forma, o FdR tem apenas duas regras: o drible vale mais que o gol — assim, a caneta, a meia-lua e o chapéu valem três pontos e o gol vale um ponto.

E a segunda regra é o fair play — aqui é o jogo limpo no “lato sensu”, na quadra. A falta é proibida e são valorizados o respeito ao adversário e ao professor. Fora da quadra, o fair play também é usado como um valor de vida, sendo transformado em respeito, honestidade, gentileza e protagonismo. Com essas duas regras bem simples conseguimos trabalhar o individual com o drible e o coletivo com o fair play.

Como uma organização sem fins lucrativos, o Instituto conta com o apoio de voluntários. Qual o papel da sociedade civil organizada e das pessoas no geral para uma sociedade mais próspera?

Alceu Natal Neto: Na verdade, o Instituto começou comigo de forma voluntária. Me dedicava ao projeto nos finais de semana e nos dias de semana trabalhava em um escritório de advocacia. Por isso, o voluntariado está no DNA do FdR.

Vemos hoje uma sociedade com pouca consciência do conceito de cidadania, de uma participação efetiva de todos naquilo que queremos ver sendo implantado como políticas públicas. A famosa frase “poucos com muito e muitos com pouco” nunca foi tão real.

A sociedade civil precisa se organizar, olhar ao redor, ver a situação caótica das cidades e, juntos, buscar essa transformação. Seja de forma voluntária, doando seu tempo e conhecimento, seja no engajamento em alguma causa, como na forma de exigir legislação e investimentos efetivos.

A transformação da sociedade que todos buscamos só ocorrerá de forma coletiva e passa por nós, do terceiro setor, pela comunidade em geral, até a reforma política.

O voluntariado está no DNA do FdR

O Instituto possui cinco projetos fixos realizados com crianças e adolescentes. Como a pandemia impactou o desenvolvimento das atividades e quais adaptações foram necessárias nesse momento?

Alceu Natal Neto: Sem dúvida fomos afetados diretamente, uma vez que nossas atividades acontecem no contraturno das escolas públicas em 22 cidades do Brasil e também dentro de alguns espaços públicos — como ginásios, centros poliesportivos, entre outros.

Nossa primeira atitude foi olharmos internamente, ou seja, para dentro do Instituto e dos nossos colaboradores. Verificamos se eles estavam preparados para trabalhar de casa, se saberiam como adaptar as aulas para o modo online. Além disso, observamos se estavam confortáveis em gravar aulas e se tinham as condições e instrumentos para isso.

Dessa forma, primeiramente cada colaborador pode levar para sua casa o material que ele trabalhava no Instituto (computadores, cadeiras, mesas, materiais esportivos, máquinas, filmadoras, etc) e após isso promovemos uma grande capacitação para essa mudança do presencial para o online.

E como foram realizadas as atividades com as crianças?

Alceu Natal Neto: Em cada núcleo das 22 cidades onde o FdR tem projetos, temos um grupo de WhatsApp com os professores locais, os pais/responsáveis pelas crianças e nossa equipe de coordenação. Dessa forma, as atividades começaram a ser mandadas nesses grupos aos finais de semana (período em que os pais passam mais tempo em casa).

As crianças tinham a semana toda para desenvolver essas atividades e os pais, sempre que possível, nos mandam fotos e vídeos dessas dinâmicas. Todas as atividades foram pensadas dentro da realidade das nossas crianças.

Então, passamos a ensinar desde fazer uma bola de meia com material reciclável, até adaptar os exercícios para espaços reduzidos. As tarefas pedagógicas desenvolvidas sempre buscam desafios com o que a criança provavelmente tem em casa e, dessa maneira, conseguimos ter êxito.

Publicamos também um e-book com atividades que podem ser desenvolvidas por pais e professores e deixamos disponível gratuitamente no nosso site para quem quiser baixar e também usar essas atividades livremente. Fizemos ainda a grande campanha solidária “Virando o Jogo”. Nesse caso, nossa preocupação era colocar comida na mesa dessas famílias.

Em 2021, estamos com uma nova edição da campanha e nos reinventando para mais atividades, criando um novo e-book e uma grande gincana online com todos os núcleos pelo Brasil, entre outras ações.

Fizemos ainda a grande campanha solidária “Virando o Jogo”

Em quase 15 anos de história, o Instituto Futebol de Rua já impactou a vida de mais de 18 mil meninos e meninas. Quais os sonhos e projetos para a iniciativa nos próximos 15 anos?

Alceu Natal Neto: Temos muito a realizar ainda. O Instituto tem muito também a amadurecer e a desenvolver em prol do esporte pela mudança social e pelo desenvolvimento humano.

Temos nossa sede em Curitiba, no Parque dos Peladeiros, e sonhamos e planejamos a construção da segunda fase dessa obra, com mais espaços esportivos, salas de aprendizagem, de tecnologia e inovação, de e-sports, de música, além de quadra poliesportiva e outros espaços. O terreno já temos e agora buscamos parceiros que nos apoiem para essa construção.

No segundo semestre de 2021 estaremos em 32 cidades e 15 estados do Brasil, mas sempre queremos atingir cada vez mais cidades e nossa luta é incessante para que isso aconteça ano após ano.

Também queremos, e muito, internacionalizar a Metodologia FdR. Em 2019, estivemos por três meses na China em uma grande capacitação de 27 treinadores e mais de 300 crianças e jovens. O planejamento era estar lá ano a ano, mas a pandemia impediu. Mesmo assim, acreditamos que em breve retornaremos.

Queremos ir para outros países também, levando os aprendizados e o que de melhor sabemos fazer. Complementando os nossos projetos para o futuro, estamos formando um grupo de estudos para ressaltar a importância que o esporte “futebol de rua” teve para o futebol de campo e para o futsal, na formação de grandes craques ao redor do mundo. Continuaremos trabalhando pelo reconhecimento e valor que o futebol de rua merece.

Sonhamos e planejamos a construção da segunda fase dessa obra

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