Capitalismo consciente: Thomas Eckschmidt conta que fazer o bem é o melhor negócio

Nessa entrevista, um dos pioneiros no movimento global do capitalismo consciente, Thomas Eckschmidt, destaca a importância do propósito, especi...

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Capitalismo consciente: Thomas Eckschmidt conta que fazer o bem é o melhor negócio

Nessa entrevista, um dos pioneiros no movimento global do capitalismo consciente, Thomas Eckschmidt, destaca a importância do propósito, especialmente em períodos de transformação, como o que estamos vivendo

Ex-produtor rural e engenheiro pela Universidade de São Paulo, Thomas Eckschmidt é um empreendedor de sucesso em negócios conscientes. São mais de 12 prêmios na trajetória e quatro 4 patentes depositadas. 

Autor com 12 livros publicados e palestrante internacional, ele é co-fundador do Instituto Brasileiro de Rastreabilidade e co-fundador da comunidade Conscious Business Journey, que tem como propósito acelerar a criação de um ecossistema de negócios conscientes, capacitando profissionais para desenvolvimento de empresas como uma força para o bem. 

Além disso,Thomas Eckschmidt também é conselheiro em diversas corporações, e tem trabalhado para divulgar a importância da causa “fazer o bem é o melhor negócio”.

E, para isso, ele conta todos os detalhes na entrevista que você poderá conferir a seguir!

Fazer o bem é o melhor negócio”

O seu livro, Capitalismo Consciente, traz alguns exercícios e questionamentos para empreendedores que querem atuar dentro deste modelo. Levando em consideração o momento atual, qual seria a principal reflexão para os empresários que estão buscando transformação e adaptação?

Sim, o livro traz um direcionamento para aplicação dos fundamentos do capitalismo consciente e tem uma abordagem muito prática. Mas, nesse momento, quando a gente pensa no que empresários podem fazer em busca de transformação e, principalmente de adaptação, entendemos que é necessário desenhar o negócio agora e pensar como ele vai operar amanhã. 

Tem muita organização esperando para ver como vai ficar o mundo, quando tudo vai voltar ao normal. Mas esse normal não vai existir mais. 

O que vem pela frente será determinado pela iniciativa e pela criatividade dos empresários mais conscientes. Será pela forma de se relacionar, a maneira e o porquê operar. 

O novo coronavírus é uma crise que vai realmente determinar as organizações que vão sobreviver daqui pra frente. A maneira que você se relaciona e o porquê vocês se relacionam, qual é sua causa, qual seu propósito.

Por que o capitalismo consciente é tão importante também para a sustentabilidade do planeta?

Vários movimentos pelo mundo falam de grupos de interesses sem considerar o meio ambiente. E, dentro do capitalismo consciente, a gente considera o meio ambiente um dos stakeholders

É um grupo de interesse que não tem representante ou um porta-voz; é uma entidade que influencia a nossa operação, da mesma forma que nós afetamos este grupo específico [o meio ambiente]. 

No início do ano, o Fórum Econômico Mundial de Davos falou de “stakeholder capitalism”. Foram mencionados o cliente, colaborador, fornecedor, comunidade de um investidor, mas o meio ambiente ainda não foi considerado. 

Em contrapartida, desde 2007, o capitalismo consciente vem propondo essa ideia de que o meio ambiente é um dos stakeholders fundamentais no desenvolvimento coletivo, na integração com todos os grupos de interesse, do ponto de vista do nosso negócio.

A pandemia acelerou o propósito das marcas?

A pandemia colocou uma distinção muito grande entre as empresas que continuam relevantes e as que perderam a relevância. Quando você, com seu talento e suas capacidades, percebe que a necessidade do mercado mudou, mas que você não se adaptou, você perde a relevância. 

Nesses casos, o propósito não faz mais sentido. Ou não existe a conexão do seu talento com a necessidade do mercado, onde o propósito começa a surgir. 

Por isso, várias empresas perderam a relevância, porque o seu talento não atende mais a necessidade de mercado. Outros negócios se fortaleceram porque perceberam que o talento existente pode atender a necessidade atual, durante e depois dessa crise. 

As pessoas se lembram quem as ajudou em tempos de crise. Isso fortalece as marcas com o propósito muito claro e relevância acentuada nesse momento de crise.

Depois de momentos de crise como o que estamos vivenciando é importante que as empresas repensem o propósito?

As empresas que perderam a relevância ou, que simplesmente o propósito deixou de ser relevante, precisam urgentemente repensar. O propósito evolui, se adapta e se ajusta à mudança do ecossistema. 

Às vezes a gente começa uma organização e o ambiente socioeconômico é um; depois de cinco, dez anos esse cenário muda. Uma crise traz transformações do ambiente socioeconômico e, a partir disso, o propósito precisa evoluir também. A gente fala muito em propósito evolutivo. 

Esse é um momento muito importante para repensar os propósitos. As empresas que não tinham propósito e conseguiram passar pela crise, vão ter que pensar.  A próxima eles provavelmente não passam.

Uma cooperativa nasce com uma intenção e liderança coletiva

Em que medida o engajamento cada vez maior dos consumidores e o acesso às informações fomentam o capitalismo consciente?

O interessante quando a gente fala de capitalismo consciente é que, cada vez, mais o consumidor olha pra isso. 

Desde o início do século, as medições têm demonstrado a tendência de aumento de consumidores dispostos a pagarem mais por uma marca ou um produto que tem uma causa, que protege o meio ambiente e que defende algo, além do lucro dos acionistas. 

Primeiro, aumenta a intenção de compra, depois realmente cresce a compra efetiva. A gente percebe que as pessoas ainda não estão convertendo 100% das suas compras em produtos de empresas conscientes.  

Mas elas já estão começando a consumir. Empresas que não tiverem uma causa clara vão perder atração e atenção do consumidor. Em um mundo transparente, como o que a gente vive, as empresas sem propósito tendem a desaparecer rapidamente.

Outra coisa que percebemos são as empresas que falsificam a intenção. Escrevem um propósito que não reflete a essência. Quando o consumidor percebe essa falsidade, a queda é ainda mais rápida. 

Então, a gente precisa tomar muito cuidado com o propósito, que precisa ser relevante e vir de dentro para fora. Se a liderança acredita que isso [propósito] é somente um jogo de palavras, o cumprimento de um checklist, cuidado! Os dias da empresa também estarão contados.

Grandes empresas já estão atuando com foco no propósito. Mesmo assim, muitos empreendedores não enxergam o capitalismo consciente como uma opção também lucrativa. Qual a sua dica para esses empresários mais céticos?

Quando a gente conversa sobre capitalismo consciente, muitas empresas e líderes acreditam que é uma tendência passageira. Algo só para cumprir responsabilidade social corporativa. 

No entanto, todos os nossos estudos, de 2007 até agora, demonstram que as empresas que praticam isso [capitalismo consciente], geram resultados financeiros até sete vezes superior à média de mercado, a longo prazo. Isso significa que fazer o bem é o melhor negócio. 

Quando a empresa gera prosperidade para todo ecossistema, o consumidor compra e o fornecedor traz a ideia. Já a comunidade, onde a empresa está instalada, a promove como uma referência. 

Então, todo o ecossistema trabalha em prol dessa causa maior quando a corporação realmente vive isso de dentro pra fora. Isso faz com que o resultado financeiro seja muito maior que a média.

Há mais de 100 anos no Brasil, o cooperativismo é baseado em propósitos como gestão democrática, intercooperação e interesse pela comunidade. O que esse modelo pode ensinar para empresas que buscam atuar dentro do modelo de capitalismo consciente?

Essa é uma pergunta fantástica. No meu passado fui produtor rural, fiz parte de uma cooperativa e nunca tive muita confiança na cooperativa. A cooperativa agrícola de Cotia, no interior de São Paulo, teve uma falência absolutamente devastadora na década de 1990. Por muito tempo eu fiquei com medo do cooperativismo. 

Até que, há mais ou menos cinco anos, conheci o cooperativismo de crédito. E aí eu percebi uma grande diferença do cooperativismo de crédito, que segue uma regulamentação muito rígida do Banco Central, enquanto o cooperativismo de produção, de distribuição e outras modalidades, não seguem esse rigor administrativo que cooperativas de crédito seguem.

Então, precisamos olhar essa qualidade administrativa das cooperativas de crédito e levar o conceito para os demais segmentos. O cooperativismo efetivamente é uma das formas mais claras ou de melhor expressão do que é o capitalismo consciente. 

Uma cooperativa nasce com uma intenção e liderança coletiva. É a partir de um propósito comum — que é prover crédito, produzir, comprar e distribuir junto. O resultado da cooperativa fica no local, com todos os associados. 

Não é encaminhado para outra região, para um acionista, para outro país. Com isso, o cooperativismo cria, com os seus valores, um movimento coletivo a favor dessa ideia. 

Então, para mim, hoje, o cooperativismo é a melhor expressão do capitalismo consciente. Todos os princípios e fundamentos de um capitalismo mais consciente estão presentes na cooperativa. 

O que a gente precisa é aprender mais entre as cooperativas. É aí que a gente vai dar um salto quântico desta modalidade de negócio de geração de valor coletivo. 

Por quê? Porque a gente não precisa de mais milionários, a gente precisa de mais gente vivendo bem. E o cooperativismo é uma das melhores ferramentas para prover a sociedade e as comunidades dessa intenção.

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